Uma das coisas que contribuíam para o clima de tensão de Crime e Castigo de Dostoiévski eram as risadas.
Marmieládov fala:
— E hoje estive em casa de Sônia e fui pedir-lhe dinheiro para beber. Ah, ah, ah!
No final a gente pode pensar que o cara está engasgando, próximo do óbito, mas na real ele só estava rindo daquele jeito cachaceiro russo típico. Ah, ah, ah! E eu me confundi várias vezes durante a leitura, mas aí 20 segundos depois eu notava que na verdade "ah, ah, ah" era uma risada e a situação toda ficava menos depressiva. Mas não muito menos, os russos só riem nos momentos errados.
Acho que esse é o maior problema da literatura brasileira, a impossibilidade de aliterar uma risada no português. "Hahahaha" faz a gente parecer colonizado, "rarará" é trademark Serginho Mallandro. Estamos sem alternativas, e não é à toa que viramos referência mundial em risadas retardadas, usando desde AEUHUEAHUEAHUAE até sakopksaopksapo.
Fiz um teste em Crime e Castigo pra ver se a gente conseguia melhorar a fluidez da leitura e acho que foi um sucesso:
— Mas por que ficas assim, tão atrapalhado! Romeu! Deixa estar que ainda hoje o hei de dizer num certo lugar. HuhaUHAUEhaeuhEHUaehuaehuaehUAE Vou fazer com que mámienhka se ria, e outra pessoa também.
Acho que vale um estudo ainda sobre o uso textual do rsrsrs, alô pós-graduações em humanas!
O autor de One Piece, mangá mais popular do mundo, teve consciência dessa dificuldade localizatória dos brasileiros e ajudou os tradutores pindoramenhos ao dar uma risada completamente sem sentido para um monte de personagem. O principal ri com "shishishi", tem um vilão que ri "shulololololo" e um cara chamado Vasco Shot que ri singelamente com "toputoputopu".
Tradutores brasileiros se beneficiariam de uma onda mais rapper e freestyle no quesito risada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário