A árvore de Natal da minha casa, que tem dois metros de altura, está montada na frente da janela, num lado da sala, e do outro lado, em frente à árvore, montamos um presépio, colocamos um candelabro de velas vermelhas e uma Bíblia enorme aberta sobre um suporte em cima de uma mesinha. Uma típica e bonita decoração de Natal. Os bonecos do presépio eram, eu não sei qual o nome daquele material, acho que de porcelana, ou algo aparentemente tão resistente quanto. Eram, como de costume, os três Reis Magos, José, Maria e Jesus. Estavam sobre uma espécie de ninho de palha, como os ninhos de passarinhos, precisamente.
O fato é que todos os dias deixamos, eu e minha mãe, a janela aberta quando saímos de casa, porque se a fechamos fica tão abafado quanto uma estufa - o ambiente ia ficar tão quente que as plantas iam crescer como as raizes que ocupam a mansão em Jumanji. Pois então. Ao voltarmos para casa à noite, sempre estávamos encontrando pedaços de palha no chão, mas pensamos que era culpa do vento, que podia estar derrubando os bonecos do presépio e espalhando as partes do ninho. Mas era recorrente. Mesmo quando não deixávamos a janela inteiramente aberta, encontrávamos pedaços de palha no chão. De tanto caírem todos os dias, dois Reis Magos do presépio quebraram; Jesus agora vai ter que se contentar somente com ouro ou mirra ou incenso.
Foi no domingo passado, quando acordei, que vi que, na verdade, era um passarinho salafrário (ou melhor, um casal de passarinhos salafrários) que estava roubando os pedaços de palha do presépio. Não eram pardais, mas eu não entendo nada de passarinhos, de qualquer forma, se os interessa, eram uns passarinhos com barriga amarela. Decidimos começar a fechar a janela para não termos mais que dividir a palha da manjedoura do Filho de Deus com o filho de dois passarinhos. De qualquer forma, desistimos da idéia de deixar o presépio sobre um ninho de palha, pois de qualquer jeito os bonecos ficavam mal equilibrados nele.
Mas mesmo assim, sem ninho e sem janela para passarinhos entrarem, continuávamos encontrando pedaços de coisas no chão. Dessa vez eram pedaços da nossa própria árvore de Natal, fiapos dos galhos, espalhados pelo chão. Noutro dia, eu e minha mãe notamos que os passarinhos ainda estavam entrando no apartamento, a partir da cozinha, e de lá seguindo para nossa sala. A cozinha fica no lado oposto do apartamento, de modo que se deve entrar pelo outro lado do prédio pelas basculantes de lá, ou pela janela da área de serviço, para entrar na nossa sala-de-estar. Imagino que esse seja um esforço hercúleo para passarinhos minúsculos com cérebros do tamanho de um amendoim, porém o que mais perturbava era a obsessão daqueles passarinhos em arrancar pedaços das nossas coisas para montar seu ninho. Por que nos haviam escolhido? Há tantas porcarias na rua de acesso mais fácil!
O motivo de tanto esforço era simples: eles já haviam montado um ninho enorme na nossa árvore e nós não havíamos percebido (é uma árvore bem grande, afinal). Era quase que totalmente constituído das palhas roubadas do presépio, mas também contava com pedaços da própria árvore e com as falsas penas das pombinhas brancas que servem de enfeite. Ah, e não, não havia nenhum ovo lá dentro.
Sei que essa não é uma história impressionante ou nada do tipo, mas eu achei bem interessante o esforço de dois passarinhos para montar um ninho e, depois, para ter acesso a ele. Ah, e também nós não deixamos os dois passarinhos consumar seu casamento dentro da nossa casa: tiramos o ninho de dentro da árvore. Afinal, não podemos permitir que dois passarinhos ladrões tenham um filho, passando para o filhote todos aspectos de suas personalidades vilanescas; nós já vivemos num mundo corrupto demais.
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